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Default Risk Capital: o componente de instrumentos não securitizados

Escrito por Matera | Mar 20, 2024 12:00:00 PM

No texto anterior, O desafio do novo requerimento de capital para risco de crédito, demos uma visão geral sobre o Default Risk Capital (DRC). Comentamos sobre seu objetivo, como está inserido no contexto das reformas da carteira de negociações no chamado Fundamental Review of the Trading Book (FRTB), além de apresentarmos seus três componentes básicos e as etapas gerais necessárias para sua apuração.

É importante notar que o FRTB propõe tratamentos específicos para o risco de crédito na carteira de negociação separando o risco de default ou jump-to-default (JTD) do risco de migração de crédito. Enquanto o primeiro é considerado no âmbito do DRC, o segundo é tratado no âmbito do Credit Spread Risk (CSR), a ser introduzido na terceira fase da reforma.

Outro ponto chave no entendimento do DRC é de que a necessidade de apuração diária do componente advém da natureza da classificação das posições na carteira de negociação, em analogia ao risco de mercado para as posições classificadas nesta mesma carteira. Entretanto, o DRC não deve ser confundido com risco de mercado, pois este último trata especificamente de perdas potenciais decorrentes da volatilidade de preços de mercado como câmbio, taxa de juros, ações e commodities enquanto o DRC endereça o risco de inadimplência das contrapartes nestas posições.

Assim, por se tratar de um novo requerimento regulatório para exposições de crédito na carteira de negociações e devido à complexidade para sua apuração, aprofundamos um pouco mais neste texto sobre seu primeiro e, possivelmente, mais relevante componente relacionado com o requerimento de capital para os instrumentos financeiros não resultantes de processo de securitização, DRCNSEC.

Uma vez identificado o conjunto de instrumentos financeiros classificados na carteira de negociação com exposição ao risco de crédito a ser alocado no grupo DRCNSEC, sua sistemática geral de apuração pode ser vista como ilustrado na Figura 1.

Figura 1 - Fluxo geral de apuração do DRCNSEC

Inicialmente, é importante termos em mente que a posição comprada se refere a um instrumento financeiro que produz perdas na ocorrência de um evento de crédito e a posição vendida aquela que produz ganhos na ocorrência de um evento de crédito. Assim, descrevemos a seguir os principais componentes de cada etapa.

Exposição Bruta

As exposições brutas são apuradas individualmente para cada instrumento sem considerar compensações entre comprados e vendidos e referem-se à perda esperada em conexão com metodologia adotada na carteira bancária. Além do mais, exposições brutas compradas assumem valores positivos enquanto que as exposições brutas vendidas assumem valores negativos sempre escalados pelo tempo.

Em relação ao escalonamento temporal, este ocorre em função do prazo remanescente do instrumento limitado ao intervalo entre 3 meses (0.25 anos) e 1 ano. Assim, exposições de até 90 dias, como é o caso de posições overnight, tem seu valor divido por quatro ao passo que exposições acima de 1 ano de prazo remanescente são travadas no limite superior. Portanto, as exposições não são amplificadas pela escala temporal.

Ainda, exposições em ações podem ser iguais a 0.25 ou 1, a critério da instituição. Instrumentos financeiros com amortizações devem considerar o prazo médio residual ponderado de recebimento do principal e, por último, derivativos devem considerar o prazo residual do próprio contrato e não de seu subjacente.

É interessante traçar um paralelo entre os modelos para perda por risco de crédito para posições classificadas nas carteiras bancária e de negociação. Enquanto o modelo para o risco de crédito para posições classificadas na carteira bancária é representado pelo produto entre exposição em default (EAD) e a severidade esperada (LGD), o modelo para o risco de crédito para posições classificadas na carteira de negociação tem seu análogo na JTD a qual é função do valor base do instrumento multiplicado pelo LGD, associado ao fator de perda FPi, e ajustado pelo resultado acumulado a mercado, no caso de título de dívida, ou valor de reposição a mercado de instrumentos derivativos.

Para manter coerência com o ajuste a mercado, ΔAjuste, o qual é negativo em caso de perdas e positivo em caso de ganhos, o valor de base corresponde aos critérios da Figura 2.

Figura 2 - Critérios para valor de base

Como regra geral, a exposição bruta somente é incorrida quando há um risco subjacente de perda em caso de default da contraparte e o valor de base é utilizado para determinar a perda de principal em caso de evento de crédito aplicando-se o fator de ponderação, FPi, sobre o mesmo. Por outro lado, a perda pela marcação a mercado é adicionada determinando a perda líquida, porém evitando-se dupla contagem de perdas. Assim, para todos os instrumentos, o valor de base é a referência na qual é determinada a perda de capital.

Por exemplo, para um título de dívida, o valor de base é o valor de face. Logo, estar comprado neste instrumento implica em exposição bruta ao passo que estar vendido não implica em exposição bruta.

Em um derivativo de crédito, há exposição bruta quando há perda com a ocorrência do evento de default. Por exemplo, ficar comprado em um swap de crédito não implica em exposição bruta, mas ficar vendido, sim. Por outro lado, em uma call sobre um título de dívida, o valor de base a utilizar no cálculo da exposição bruta é zero, uma vez que, em caso de default, a opção não será exercida.

Já o fator de perda FPi, por estar relacionado com a severidade, tem um percentual entre 0% e 100% onde quanto maior o risco de perda em caso de default, maior a severidade do instrumento. Por essa razão, ações, dívida subordinada e instrumentos com evento de crédito recebem a maior severidade. Dívida não subordinada recebe FPi de 75%; Covered Bonds recebem 25% e derivativos com cláusulas que prevejam sua dissolução em caso de evento de crédito, sem exposição ao evento de crédito em si, recebem 0%. Derivativos em geral deve ter seu FPi determinado com base em seu ativo subjacente.

Exposição Líquida

A obtenção das exposições líquidas, JTDL, a partir das exposições brutas é relativamente direta dependente apenas dos requerimentos definidos na norma. Mais especificamente, aceita-se que as exposições brutas vendidas possam ser compensadas com as exposições brutas compradas desde que estas duas exposições se relacionem a um mesmo devedor e que as exposições vendidas tenham prioridade de pagamento menor ou equivalente àquelas das exposições compradas.

Por exemplo, uma exposição comprada de R$ 10 milhões em um título de dívida sênior emitida por uma empresa pode ser compensada por uma exposição vendida de R$ 4 milhões em ações desta mesma empresa resultando em uma exposição líquida comprada de R$ 6 milhões. Por outro lado, uma exposição comprada de R$ 10 milhões em ações desta mesma empresa não pode ser compensada frente a uma eventual exposição vendida de R$ 4 milhões em títulos de dívida da mesma. Em outras palavras, por conta da menor senioridade das ações frente ao título de dívida, nesta segunda situação as duas exposições devem ser mantidas separadas, ou seja, sem considerar efeitos de compensação.

Razão de Hedge

A possibilidade de redução na carga de capital da componente DRCNSEC ocorre através da razão de hedge, HBRNSECj, a qual considera a cobertura do risco de crédito ainda que de forma parcial das exposições líquidas vendidas com as compradas.

Para esta finalidade, as exposições líquidas associadas a esta componente são classificadas em três possíveis categorias, conforme as características do devedor: pessoas jurídicas de direito privado; governos centrais e respectivos bancos centrais, organismos multilaterais ou Entidades Multilaterais de Desenvolvimento; e governos regionais e autoridades locais, como estados e municípios. Conforme o documento do Comitê de Basileia, MAR22 - Standardised approach: default risk capital requirement, essas três categorias são respectivamente denominadas de Corporate, Sovereign e Local Governments and Municipalities.

Importante observar que essa cobertura do risco de crédito é permitida entre exposições em uma mesma categoria, porém não entre categorias distintas. Adicionalmente a esta restrição a cobertura de risco também somente é permitida em um mesmo grupo de risco a fim de que a mesma probabilidade de default (PD), implícita nos respectivos ponderadores de risco (RW), seja aplicada simultaneamente às exposições líquidas compradas e vendidas em cada caso.

Requerimento de Capital

Assim, enquanto que a razão de hedge é calculada em cada categoria considerando o total das exposições líquidas compradas e vendidas na mesma, o requerimento de capital na respectiva categoria depende da aplicação dos ponderadores de risco de cada categoria e situação prevista na norma, conforme pode ser visto na Figura 3.

Um ponto relevante a ser comentado é que na categoria de pessoas jurídicas de direito privado para instituições do segmento S3, é facultada a aplicação simplificada de fatores de ponderação considerando-se 15% para devedores em que não se verifica evento de crédito e 100% caso contrário.

Contudo, chamamos atenção ao fato de que esta simplificação implica em uma carga de capital potencialmente mais elevada para exposições com instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central, uma vez que, poderiam ser aplicados fatores de ponderação de apenas 3% ou 6%, dependendo do caso.

Figura 3 - Ponderadores de risco por categoria e requerimento regulatório

Para finalizar a apuração do DRCNSEC, é suficiente notar que este é obtido pela soma algébrica da carga
de capital de cada uma das categorias acima.

Em síntese, a apuração do DRCNSEC segue quatro etapas básicas:

  1. As exposições brutas são calculadas para cada instrumento sem considerar compensações entre exposições compradas e vendidas mesmo que relacionadas com um mesmo devedor;
  2. Exposições líquidas podem ser obtidas em um mesmo devedor eventualmente compensando-se exposições compradas com vendidas de acordo com os requerimentos normativos;
  3. Em uma mesma categoria, exposições vendidas líquidas, ponderadas pelo risco de default, podem ser descontadas de exposições compradas líquidas, também ponderadas pelo risco de default, em função da razão de hedge, HBRNSECj; e
  4. A componente de capital é determinada pela soma algébrica dos requerimentos de capital de cada categoria.


Considerando que esta é apenas a primeira das três componentes para dimensionamento do risco de crédito na carteira de negociação, fica clara a complexidade de cálculo, além de aspectos adicionais como coleta, tratamento, processamento e análise das informações para reporte tanto para o Supervisor quanto internamente à instituição.

Adicionalmente aos desafios operacionais em regime de produção diária, também são consideráveis os desafios para seu desenvolvimento e manutenção ao longo do tempo. Sobretudo, considerando-se eventuais ajustes que a regulação possa vir a demandar.

Por isso, acreditamos que ter um parceiro capaz de fornecer uma solução completa e robusta para atendimento desta regulação pode ser estrategicamente importante para sua instituição na otimização de esforços ao longo do tempo.